Desde 2019, Tayza Mirele de Amorim, 31, enfrenta com lucidez e otimismo o seu maior desafio: conviver com a síndrome de Li-Fraumeni, uma mutação genética rara que aumenta a propensão para o desenvolvimento de câncer primário em diversas partes do corpo de maneira frequente. O seu primeiro diagnóstico veio em 2017, aos 25 anos. Até então, ela não tinha ciência de que era portadora da síndrome, a mesma responsável por facilitar outros diagnósticos em sua família – pais, irmã e avó faleceram em decorrência do câncer.
A mutação ocorre no gene TP53 (ou P53), uma proteína que tem a missão de suprimir tumores e nos proteger do câncer. Apesar de ser considerada rara, a síndrome de Li-Fraumeni tem prevalência muito maior no Brasil, mais precisamente no Sul e Sudeste, do que no resto do mundo devido aos nossos ancestrais. Essa é uma descoberta feita anos atrás pela médica geneticista Maria Isabel Achatz, até então do A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo.
O caso de Tayza, pernambucana e paciente do Hospital de Câncer de Pernambuco (HCP), acende um alerta por não ser comum o diagnóstico dessa síndrome na nossa região, além de outros fatores, como explica Dr. Vandré Carneiro, cirurgião oncológico e diretor do Programa de Câncer Hereditário do HCP, e titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO).
“Câncer em uma idade jovem, mais de um tipo de câncer em uma única pessoa e histórico familiar forte de câncer chamam atenção para uma possível pré-disposição para câncer e essa pré-disposição pode ser Li-Fraumeni. Nesse caso, o rastreio é mais rigoroso para detectar o câncer em fase inicial e evitar que ele se espalhe”.
O especialista acrescenta que a síndrome é incurável. E uma vez descoberta no indivíduo, é necessário testar os filhos, pois há 50% do gene ser passado adiante. A filha de Tayza, de 12 anos foi testada, mas não herdou a mutação genética causadora da doença.
Tumores com alta ocorrência
De acordo com Dr. Vandré, um dos mais prevalentes para quem tem a síndrome é o de mama, em mulheres jovens. Além desses, há outros tumores:
“O sarcoma de partes moles, tumores do sistema nervoso central, carcinoma de adrenal ou adrenocortical são outros tumores bem frequentes para quem tem a síndrome. A leucemia aguda também é outro câncer frequente para quando há essa condição. No caso do de mama, o alerta é quando aparece em mulheres antes dos 35 anos”, completa.
Primeiro tumor aos 25 anos
O primeiro tumor maligno que surgiu em Tayza foi na mama, o mesmo que a mãe dela teve. E por ter convivido em meio a realidade de câncer na família durante anos, a estudante de biomedicina recebeu o diagnóstico com naturalidade e força, alicerces fundamentais para o que ainda estava por vir. Em 2019, apareceu um novo tumor invasivo na mama esquerda e algumas cirurgias precisaram ser realizadas, todas bem sucedidas.
“No mesmo ano descobri que tinha a síndrome de Li-Fraumeni, eu nasci com essa doença e não há cura. A decisão mais acertada pra mim foi entender a minha realidade e seguir em frente. Hoje, é uma condição normal para mim. Eu faço tudo que quero fazer. A diferença é que agora cuido mais da minha saúde”, diz.
No HCP, Tayza é acompanhada por vários especialistas. De tanto ouvir opiniões e explicações a respeito da condição crônica de saúde, ela sabe de todos os detalhes da sua trajetória desde quando descobriu o primeiro tumor. Ela lembra que no início havia uma urgência médica na realização dos exames, o que é verdade. Portadores da síndrome têm prioridade no atendimento oncológico por ter mais chances de ter câncer do que qualquer outro, independente de fatores de risco externos.
“Para mim é muito importante entender o que tenho. E saber de tudo não me torna uma pessoa triste, pelo contrário. Eu sou feliz e até gosto de ter todos os compromissos dentro do hospital porque é no HCP que vejo possibilidades para viver mais”, afirma.