O aconselhamento genético identifica síndromes hereditárias de câncer, o que possibilita uma conduta médica preventiva
Enquanto os fatores ambientais e comportamentais causadores do câncer podem ser evitados com hábitos saudáveis, há um componente não evitável que aumenta a possibilidade do desenvolvimento da doença em indivíduos de uma mesma família: a hereditariedade – ou seja, a grande chance de uma mutação nos genes causar um crescimento desordenado nas células, levando ao aparecimento do tumor. Neste cenário, surge a oncogenética, área da oncologia que, por meio do aconselhamento genético, identifica e informa ao paciente o risco da predisposição para o câncer, com objetivo de evitá-lo. Tornar esse aconselhamento acessível aos pacientes do SUS é o objetivo do Programa de Câncer Hereditário do Hospital de Câncer de Pernambuco (HCP), um novo serviço que tem se inserido em projetos nacionais para viabilizar o teste genético gratuito para pacientes da instituição.
Como explica o coordenador do serviço de Pelve e diretor do Programa de Câncer Hereditário do HCP, o cirurgião oncológico Vandré Carneiro: “A predisposição genética avalia pacientes com síndromes hereditárias que aumentam a chance de desenvolvimento do câncer, e nos possibilita agir de forma preventiva com esse paciente e com sua família, seja através de uma cirurgia redutora de risco ou de um diagnóstico precoce, que aumenta as chances de cura”, pontua. Para se ter uma ideia, uma mulher comum, sem predisposição hereditária, tem chance de 8 a 12% de desenvolver o câncer de mama (1 em cada 10 são diagnosticadas com a doença). Se a mulher for portadora de uma mutação no gene BRCA1, esse número sobe para 70% (7 em cada 10) – é o caso da atriz Angelina Jolie, que passou por uma cirurgia redutora de risco, em 2013, para prevenção do câncer de mama e de ovário. Embora menos comuns, os dados são semelhantes quando relacionados a outros tipos de tumores, como câncer próstata, melanoma e estômago.
A necessidade da investigação genética surge com a suspeita de síndrome hereditária em pacientes enquadrados em alguns critérios clínicos, a exemplo de jovens diagnosticados com câncer; pessoas com mais de um tipo de câncer ou quando há histórico familiar da doença. Nesses casos, é indicado que o indivíduo faça o teste genético, por meio do qual é coletada uma pequena amostra de sangue ou saliva para identificar a existência de possíveis mutações no DNA. “A grande questão é que esta testagem não é disponibilizada pelo SUS. Por isso, por meio de projetos e publicações em congressos internacionais, nosso Programa visa provar que o aconselhamento genético possui um grande custo-benefício para o paciente e para o Sistema, pois evita onerar um tratamento caro e pode evitar que o indivíduo tenha câncer”, explica. O Programa já aprovou publicações no Congresso Europeu de Cirurgia Oncológica, na Hungria, e no Instituto Português de Oncologia, em Lisboa.
Um dos projetos citados pelo cirurgião é o Genomas Raros, do Hospital Israelita Albert Einstein, que leva sequenciamento genético a pacientes do SUS. Em menos de um mês, cerca de 50 famílias de pacientes do HCP enquadradas nos critérios clínicos acima citados já foram beneficiadas com as testagens. “Para o paciente, os benefícios são claros: diminuição do risco de outros cânceres, possível mudança no tratamento e prevenção do câncer em membros da família”, pontua dr. Vandré. Com o HCP, também participam do projeto pacientes dos hospitais Barão de Lucena e IMIP, cadastrados no Programa de Câncer Hereditário de Pernambuco, criado há cerca de 4 anos. “O objetivo é testar muito mais famílias”, completa. Além disso, o HCP irá participar de um projeto com a Fundação de Amparo a Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE), para testagem dos familiares de pacientes oncológicos com mutações genéticas. “Para o HCP, é algo inovador. Ser contemplado com os projetos trará um conhecimento gigante para pesquisa e assistência na instituição”, afirma.
Vale ressaltar que todo o processo de aconselhamento genético respeita a autonomia do paciente, que deve estar ciente de todas as implicações do teste e do resultado, bem como deve concordar em participar, através da assinatura de um termo de consentimento. Em todo o processo, ele é acompanhamento de perto pelo médico.